Por Ron Claassen, tradução de Paulo Roberto Purim
Existirá uma alternativa para a vingança e para a retribuição na resposta a um dano, uma injustiça? Walter Wink (em Engaging the Powers: Discernment and Resistance in a World of Domination) afirma que a resposta preferencial da nossa sociedade é a vingança, aquilo que Wink rotulou de “mito da violência redentora”.
O mito da violência redentora, ele diz, é a crença de que a violência é uma resposta necessária e apropriada e até mesmo curativa, especialmente quando administrada pelo Estado em favor da vítima. Wink salienta que Jesus rejeitou claramente a violência como meio construtivo de responder ao dano ou à injustiça, e ajuda-nos a compreender que há algumas alternativas para a violência.
Uma passagem da escritura que Wink usa para ajudar-nos a compreender que há alternativas para a violência encontra-se no quinto capítulo de Mateus, no qual Jesus diz: “Vocês ouviram o que foi dito, 'olho por olho e dente por dente', mas eu digo a vocês”. Segue-se uma série de declarações que soam terrivelmente irreais e parecem convidar a parte ofendida a tornar-se um verdadeiro “capacho”.
Jesus diz coisas como: “Se alguém bater na sua face direita, ofereça também a outra” e “Se for forçado a carregar um fardo por uma milha, carregue-o por duas” e “Se alguém tomar o seu casaco, dê a ele também a capa”. Então, como isso já não aparentasse passividade suficiente, Jesus acrescenta: “Vocês já ouviram o ditado 'ame seu próximo e odeie o seu inimigo', mas eu digo a vocês “amem os seus inimigos”. Aqui nós sem sombra de dúvida perdemos a sintonia, porque simplesmente não somos capazes de nutrir sentimentos ternos e efusivos por alguém que acaba de cometer uma ofensa séria contra nós.
Então de que forma, quando ofendidos, devemos entender e levar a sério o que Jesus está dizendo? Achei muito útil o esforço de Wink em descrever o contexto em que Jesus está falando, a fim de compreender como Jesus poderia estar querendo que respondêssemos. A mais fácil de explicar das três sugestões “capacho” é a que fala sobre carregar um fardo. O contexto era o seguinte: os soldados da força de ocupação romana freqüentemente carregavam mochilas pesadas, e tinham o costume de obrigar os habitantes locais a carregá-las para eles. Era uma prática degradante e muito incoveniente, e era interpretada como uma injustiça ofensiva pelos habitantes locais. Os soldados, por outro lado, consideravam-no seu “direito”, já que, afinal de contas, eram eles que detinham o “poder”. As autoridades do exército apoiavam o direito dos soldados a essa prática, mas perceberam também que ela deveria ser limitada para não tornar-se “abusiva demais”. Por essa razão impuseram um limite de uma milha para a distância que um soldado podia obrigar um habitante local a carregar a sua mochila.
É portanto nesse contexto que Jesus fez a declaração “Se for forçado a carregar um fardo por uma milha, carregue-o por duas”. Essa deixa então de parecer uma reação “capacho”. De fato, torna-se até um tanto agressiva. É uma reação não violenta e assertiva – e não passiva. Tente imaginar a situação. Creio que seria algo mais ou menos assim: para começar um soldado obriga um habitante local a carregar sua mochila. No final da milha, o soldado pede que o homem devolva o fardo. Mas, de acordo com a sugestão de Jesus, aquele que foi obrigado a carregar a mochila deve simplesmente continuar andando, recusando-se a obedecer a ordem de devolvê-la e sabendo que isso poderia colocar o soldado sob o risco de uma possível punição. A iniciativa foi tomada agora pela vítima, aquele que há pouco havia parecido impotente. Não apenas essa não é uma reação passiva, é muito possível que pudesse tornar-se por sua vez uma reação abusiva. Parece que é por isso que imediatamente depois de sugerir essas reações Jesus diz “amem (agape significando mais literalmente 'sejam construtivos para com') seus inimigos”.
A Justiça Reparadora não deve ser confundida com aprovar, ignorar ou afirmar que é “tudo bem” fazer o que é errado. A Justiça Reparadora precisa desenvolver reações assertivas e construtivas que tragam atenção apropriada para o problema de modo a encorajar o ofensor a reconhecer e aceitar a responsabilidade pela ofensa. Isso feito, as vítimas mostram-se surpreendentemente dispostas a considerar soluções para que a eqüidade possas ser restaurada e acordos sejam realizados para o futuro, a fim de que a injustiça não seja repetida. Se o ofensor aceita a responsabilidade e cumpre os acordos, a confiança cresce e a reconciliação (movimento ao longo de um contínuo que vai de “ódio crescente” a “afeição crescente”) acontece.
Fonte: A Fé Na Ponta da Espada
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